Avenida do Quitexe, ou Rua de Baixo, zona das instalações militares. À
esquerda, a antiga casa da Madame Van der Schaf - a Casa Guerreiros. Na esquina,
o restaurante Pacheco, onde há 40 festejei os meus 22 anos. Ficava em frente
à secretaria da CCS e Casa dos Furriéis - foto de Carlos Ferreira, em Dezembro
de 2012. Em baixo, eu mesmo, na mesma avenida, há 40 anos. O Pacheco ficava atrás,
do lado esquerdo da foto
A 21 de Novembro de 1974, estava eu no uíjano Quitexe, na nossa angolana jornada africana. Fiz 22 anos e, creio bem, foi a primeira vez que dei alguma importância a tal dia. Cá por casa, pouca importância se dava a efemérides deste tipo, os meios não eram fartos, era modesta a família, e crescíamos com o desejo e gosto de receber um par de meias como prenda, quando muito! Lá pelo Quitexe, foi diferente!! Talvez porque o moínho da saudade nos fazia mais nostálgicos, porque mais e melhor levedava o sentido de paixão e afecto pelas nossas gentes mais próximas, mas que estavam a milhares e milhares de quilómetros e nós em teatro de guerra.
O dia correu bem, pois a sementeira de cumplicidades do grupo era grande - e a colheita maior!!! - e todos nos sentíamos irmãos, família e "amantes", diria! Neste fim de tarde de hoje, aqui em casa e quando se faz tempo para o jantar de família (desconfio que me está a chegar uma prenda de Lisboa!!!...), voltei a reler algum correio da data, recebido pelos dias mais próximos desse tempo de 1974, e dou conta que alguns amigos, por esta ou outras razões, "desapareceram" do nosso palco diário. É a vida! Não que falecesse a amizade e o carinho, mas as fronteiras do mundo separaram os nossos dias.
Há 40 anos, fiz a festa com amigos Cavaleiros do Norte e, hoje, na hora do almoço, esteve o Francisco Neto a representá-los, refrescando a memória para a jantarada desse dia, no Pacheco, com os apaparicos gastronómicos de D. Maria Lázaro, a cozinheira cabo-verdeana que fabricava sabores novos com as especiarias de lá.
O dia, em Luanda, foi de mais 6 presos,«com as mãos atadas atrás das costas, alguns deles feridos e apresentados à imprensa estrangeira» pelo MPLA. Tinham sido capturados pelas Comissões de Vigilância do partido de Agostinho Neto, nos musseques. Um deles, acusado de assassínio; outro, de extorquir dinheiro em nome do MPLA; os restantes, de roubos - «todos acusados de se intitularem, falsamente, militantes do MPLA».
A FNLA, do seu lado da barricada, denunciava que «19 pessoas foram forçadas, recentemente, a abandonar os seus lares, no (bairro do)Catambor». Estavam«protegidas pelas Comissões da FNLA» e os seus dirigentes deixavam entender, segundo o Diário de Lisboa, que «teriam sido forçadas a abandonar as residências, na semana passada, por aderente armados de um movimento rival - cujo nome não quis revelar». A Forças Armadas Portuguesas, por sua vez, anunciaram «um africano morto a tiro» e também«dois negros e dois brancos feridos com armas de fogo, na segunda e terça-feira» - dias 17 e 18.
As negociações em Argel, entre Melo Antunes e Agostinho Neto, decorriam em «clima de autêntica fraternidade», como disse o ministro sem pasta de Portugal.
Foi assim o meu dia de 22 anos. Há 40!